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sábado, janeiro 31, 2004

TAL MÃE, TAL FILHO (E TAL NETO)



A Revista do «EXPRESSO» (aquela que está sempre a mudar, para ficar na mesma), publica hoje um interessante artigo sobre jovens portugueses que se dedicam à genealogia e à heráldica (não, não é nenhum dos dois extraterrestres da fotografia de baixo).
A grande revelação é a da descoberta da ascendência portuguesa dos Bush, esses mesmos, os da Casa Real Norte-Americana. Lê-se, por duas vezes, no «Expresso»: «O clã Bush descende de D. Urraca, mãe do fundador de Portugal».
Ora bem, a partir de hoje, ganhamos um novo pretendente à coroa portuguesa (vindo directamente da dinastia Afonsina), a D. Urraca um novo neto e o D. Afonso Henriques uma mãe nova.
Com o «Expresso» e os talentos que revela, está-se sempre a aprender.

sexta-feira, janeiro 30, 2004

O MANEL DOS ANJOS



O meu velho amigo Manuel dos Anjos, camarada antigo de lutas passadas, anda um bocado incomodado com o que aqui vai lendo e, vai daí, zurziu-me de alto a baixo.
Glosas à parte, com o que o Manel verdadeiramente se chateia é com o facto de, ao contrário dele, eu já não amar a pátria, e desdenhá-la qual amante gastadora e traiçoeira, num exercício que ele considera muito português e banal.

Eu sou amigo do Manel vai para mais de vinte anos. Conhecemo-nos numa altura das nossas vidas, ainda imberbes, no meio de muitas revoluções, em que só podiamos ser uma de três coisas: comunistas, fascistas ou parvos. Como parvos não seríamos e comunistas também não, está bem de ver que juntos cantámos de "braço ao alto" o Cara al Sol e a Ressureição aos acordes sublimes do Zé Campos e Sousa, que sempre teve uma enorme pachorra para aturar a rapaziada até altas da madrugada.

Acontece, porém, que o Manel continuou, com o passar dos anos, a levar muito a sério o estatuto de patriotas (nacionalistas-revolucionários, não era?) que a nós mesmos impuseramos, entre duas cervejas e as cantorias do Zé, e ainda hoje proclama o seu profundo amor pela Pátria que o viu nascer.
O pobre do Manel ama o que não existe. É um platónico da política. E, do seu tranquilo recanto alentejano, continua a sonhar com epopeias lusitanas, com o V Império, com o regresso a Alcácer-Quibir. Imagina que Portugal foi e poderá voltar a ser, grande no mundo, desde que as suas nobres gentes reconheçam os «bons princípios» e a «sã doutrina». E, acima de tudo, acha que cada dia que passa com a bandeira da República içada nos mastros das repartições públicas, é uma Aljubarrota gloriosa, e um arauto de um governo que está próximo, em que príncipes e fidalgos, a aristocracia do espírito, as elites verdadeiras, devolverão à Pátria a grandeza que lhe foi vilmente tirada.

No fim de contas, o Manel recusou-se a crescer. Ele sabe bem que isto não é, nem nunca foi, verdade. E que a vida dos homens é um pouco mais simples e um tanto mais complexa do que nos faziam crer os estereótipos do passado. Aí, então, vale de facto a pena ler um livrito da rapaziada austríaca, acompanhado de um bom doze anos e um Partagás cubano. A única Lusitania que ainda vou tolerando.
CAUSA GALÁCTICA


ELES ESTÃO EM TODO O LADO!


OUTROS UNIVERSOS, OUTRAS GENTES



Ao saber da existência de outros «universos», graças à prestável informação de CN, o Catalaxia decidiu reforçar a sua redacção contratando os dois extraterrestres da fotografia. A um ficou entregue uma nova secção de modas e bordados e ao outro uma de heráldica. Adivinhem quem é quem.
O«LIBERALÓMETRO» EM ACÇÃO


IDENTIDADES II

Do nosso amigo PMF, recebemos o seguinte e-mail, que assinamos por baixo:

Caro RUI,
Concordo plenamente com as considerações e conclusões expressas in Identidades...Claro que nacionalismos patrioteiros e vazios não fazem hoje em dia (será que algumas vez fizeram?) sentido. De resto, há uma permanente confusão a propósito de "Identidades". Confundem-se, sistematicamente, identidades nacionais, regionais, locais (e outras que tais, correspondendo sempre, em maior ou menor medida, a abstracções e a exercícios de "personificação"), com a "identidade" dos Estados. A discussão a propósito do processo de integração europeia é um bom exemplo: claro está que qualquer passo dado no sentido do aprofundamento comunitário (ou, simplesmente, mudança qualitativa, com ou sem "Constituição" Europeia...) é sempre um processo de perda de "identidade" estadual - no sentido de que o que se busca é a institucionalização de outras formas alternativas de organização e exercício do poder (à figura técnico-juríidco-política "Estado").
Mas, por outro lado, o que é que isso afecta directamente aquilo que se pode designar por história (novamente, abstrações e generalizações à parte), sensibilidades, gostos (por caramelos de Badajoz, Tui ou outro lado qualquer) e opções de vida privada individual, porventura partilhados, em liberdade, com grupos mais ou menos alargados de pessoas (comunidades), traços comuns de personalidade, etc., etc.?
A nação (realidade sociológica), o país, a "terra" (ou "terrinha"), até mesmo as linguas, as ditas expressões culturais, enfim, a esfera individual de cada um de nós e o essencial das suas "projeções colectivas", sem dúvida, imediata e directamente, passam sempre ao lado dessas "crises de identidade" estaduais. De resto, atendendo ao actual estado das coisas, tenho a forte convicção de que todas as identidades (a começar pela minha própria identidade pessoal!) só teriam a ganhar com uma fulminante crise de identidade do "Estado" (abstracção/forma de organização do poder político) português!

PMF

JORGE SILVA MELO



Jorge Silva Melo, actor e encenador, recusou ontem o Prémio Almada, no valor de 25 mil euros, que o Instituto das Artes lhe atribuiu. «Não gosto de prémios do Estado», disse.
Parabéns.
MARTE ATACA!



Um dos motivos que me levou, há tempos atrás, a tentar abandonar a blogosfera, foi a falta de pachorra para polémicas com outros blogers, que me faziam perder tempo com questíunculas que verdadeiramente não me interessavam. A meu ver, a blogosfera é um exercício solitário, por isso se diz que um blogue é uma espécie de diário aberto onde escrevemos tudo o que nos apetece, sem termos de dar justificações seja a quem for, muito menos a quem faz o mesmo que nós.

Vem isto a propósito de algumas controvérsias que esporadicamente tenho sido obrigado a manter com alguns participantes da Causa Liberal, ora sobre a monarquia e a democracia, ora sobre o federalismo ou outra coisa qualquer, e, hoje, vejam lá bem, sobre ao conceito de nação e o seu valor actual.

Aproveito para aqui declarar solenemente, que desde há muito me irrita a ideia de «causa». De qualquer causa, seja ela qual for. Quem tem causas e vive para elas, em regra, dá-se mal. Ou melhor, se não conseguir entender que, em última análise, quase tudo tem um valor relativo e, absoluto mesmo, só Deus (para quem Nele acredite), acabará, mais tarde ou mais cedo, por ter graves dissabores existenciais. E eu, que sobre a vida não tenho ilusões por aí além, não me apetece andar zangado com ela, porque a minha «causa» ou as minhas «causas» não se materializam ao sabor do soberano império da minha vontade.

Não vale a pena, portanto, ter objectivos existenciais últimos e derradeiros que nos consumam permanentemente. Essa é, de resto, uma maneira infantil de encarar a vida, que felizmente na maior parte dos casos o tempo se encarrega de corrigir. Quando muito, na puberedade, podemos viver dois ou três episódios que nos tragam obcecados, em estado de permanente exaltação, sei lá, um grande amor, uma paixão impossível, uma revolução de opereta, outra tragédia romanesca qualquer. Mas, com o passar dos anos e o andar do tempo, as coisas perdem o seu aparente valor, adquirem a sua verdadeira dimensão e surgem-nos frontalmente efémeras, como tudo o que é especificamente humano.

No domínio da política, matéria de estrita humanidade, temos de convir que o que pensamos não tem valor absoluto. Sobretudo, porque qualquer raciocínio político é, por definição, pluralista, isto é, destina-se não apenas a nós mas a um número indeterminado de outras pessoas. Que poderão legitimamente entender de forma diferente tudo aquilo que nos parece evidente, e não ter até a mais pequena pachorra para nos aturar.
Face a isto, um racionalista entenderá que tem a obrigação de impor o seu modelo social, que ele «sabe» ser melhor para a comunidade, enquanto que um liberal deixará a comunidade agir livremente e respeitará a ordem cataláctica ou espontânea. Mesmo que esta caminhe em sentidos que não lhe agradam.
Tudo o mais é puro construtivismo político. Mesmo que seja um construtivismo supostamente liberal. Irritam-me, por conseguinte, formulações deterministas do género "temos que", ou "isto não é assim, mas assado", como se fosse legítimo impor a montante e a jusante um index do que é politicamente correcto. Neste caso, "liberalmente" correcto. Confesso que vivo mal com quem tem certezas e convicções políticas absolutas. Sou relativista, sem dúvida, admito que isso possa irritar quem tiver «causas», mas não me consigo afastar do paradigma popperiano segundo o qual o valor de uma lei científica está na sua refutabilidade.

Como tal, espantam-me as certezas com que frequentemente a Causa Liberal invectiva e contrapõe o que aqui é escrito. Sobretudo quando eu, que me considero, há muitos anos, um liberal da velha cepa e dos quatro costados, não me reconheço em muito do que lá vou lendo, sem que me tenha dado, até hoje, ao trabalho de contestar o que por lá está escrito, exceptuando naturalmente o execício de replicar. Parece que existe por lá uma maquineta qualquer, talvez um «liberalómetro», que permite enunciar um index liberal, um dogmatismo e uma clarividência doutrinária, que leva à fogueira censória dos seus escribas todos quantos se afastam da ortodoxia imposta: «não és monárquico?, levas na corneta!»; «gostas da democracia representativa?, levas na corneta!»; «não aprecias a nação?, levas na corneta!», «és federalista?, levas na corneta!».

A última graça, foi uma posta assinada por um certo CN, que não tenho o prazer de conhecer, mas que habitualmente se dá ao trabalho de ler e critricar enfaticamente o que aqui vou escrevendo. Desta vez, ditou do alto da sua sabedoria, a propósito de uma "posta" sobre a suposta identidade nacional, este magnífico mandamento: «Nação é uma noção cultural com toda a validade, temos a nossa família, a comunidade, a Nação, também temos raças, etnias, religiões, formas de viver e morrer, e um dia seremos todos seres humanos até aparecerem seres de outros planetas ou universos». Ora toma!
Perante tamanha acumulação de sabedoria que, num só período, me consegue demonstrar a essência da nação, da raça, da etnia, da religião, da família, da comunidade, da humanidade e da fraternidade cósmica, mais não resta senão render-me e pedir perdão por levianamente me ter afirmado liberal, queimar e esquecer tudo o que li nos últimos anos, e remeter-me ao temor dos ígnaros.

Nesta vida tão frágil e em que tudo me parece incerto e inseguro, não há como ter uma
vanguarda liberal que me ponha na linha quando eu me afasto da ortodoxia legitimamente imposta. Está visto que perante heresias tamanhas, o melhor que tenho a fazer é dar um chuto nos livrinhos do Hayek e do Mises, aproveitar a alusão aos «seres de outros planetas e universos» (sic), ligar o televisor e o DVD, e regalar-me com o Marte Ataca do fantástico Tim Burton. Felizmente que para os simples como nós, sempre resta o audiovisual.

quinta-feira, janeiro 29, 2004

IDENTIDADES

Num eventual acesso de mau génio, próprio de quem tem mais de setenta anos e muito dinheiro para gastar, José Manuel de Mello invectivou os cidadãos habitantes do rectângulo continental português, a concederem na união ibérica.
Vasco Pulido Valente, acabado de sair de um longo período de recuperação que lhe terá azedado ainda mais o seu proverbial mau feitio, acrescentou que a Espanha nem para isso nos quer, porque tem já o reduzido mercado português à completa disposição dos seus produtores, sem ter a maçada de se responsabilizar politicamente por esta gente desagradável e difícil de governar.
No Catalaxia, humildemente defendemos que Portugal soberano, nacional e nacionalista, não só não faz sentido, como é uma ideia desfasada de qualquer aproximação à realidade em que vivemos. Menos ainda se a essa ideia identitária quisermos fazer corresponder a categoria sociológica da «nação portuguesa».
O VilaCondense deu, em oportunas postas, conta desta verdadeira conspiração acidental e, por sua vez, invectivou o iberismo que abdica da identidade que supostamente possuímos. Não estamos, naturalmente, de acordo.

Ora, eu não creio em identidades políticas colectivas, expressão por vezes sinónima do conceito de Nação. Não julgo que exista algo de tão forte assim que identifique alguns milhões de almas num passado, num presente e num destino comuns.
De resto, deste sempre os habitantes de Portugal enjeitaram o seu passado: Egas Moniz penitenciou-se ao rei de Leão pelos tresloucados actos do seu amo e senhor; Afonso II desagradou aos notáveis do reino e à Igreja, que o desalojou da coroa graças aos queixumes do Bispo do Porto junto do Papa; o filho de Afonso IV zangou-se com o pai, porque este mandou esventrar a sua amante; Pombal derreteu chumbo incandescente nas orelhas dos Távoras; e a lista de desavenças e desacatos poderia prolongar-se por mais algumas maçadoras linhas. Terminaríamos na repulsa que os mais acesos patriotas manifestam pelo ciclo do salazarismo, ou a indignação que a descolonização inspira a muito cidadão comum, ou ainda nas diatribes que o insular Alberto João manifesta contra a «exploração do continente».
Não querendo prolongar a prosa, o facto é que a nossa «Nação» não viveu nunca uma saudável relação com a sua história. Provavelmente isso passar-se-á noutros países, o que não ajuda a validar o pressuposto da identidade de uma nação, dentro de um território, partilhando um destino comum. Pelo contrário.

A verdade dos factos é que o turismo de massas, que explodiu na segunda metade do século XX, demonstrou que as pessoas se estão nas tintas para a soberania identitária. Preferem comprar caramelos em Badajoz e voltar no mesmo dia a Lisboa, a estarem horas infinitas numa bicha fronteiriça para terem o orgulho de exibirem um bilhete de identidade que afira a sua nacionalidade a um soldado da GNR. Ou queimarem-se nas praias de Benidorm e Torremolinos, toalha geminada com a de um motorista TIR alemão, do que serem tratados caninamente pelos seus compatriotas algarvios. A verdade é que o turismo de massas fez explodir as fronteiras e desfez o pouco que ainda sobrava do orgulho nacional.

Estes fenómenos, a que prosaicamente os politólogos e sociólogos (curiosas designações) designam por «globalização», mais não são do que o princípio da libertação do indivíduo face a uma opressora máquina de poder, que é o Estado nacional, inventado no ciclo oitocentista da Revolução Francesa.
Hoje em dia, as pessoas querem cada vez mais que o Estado as não incomode. Pagam, se preciso for (e, infelizmente, ainda o é), para que isso aconteça. Preferem saber da vida dos seus ídolos das novelas televisivas, a conhecer os destinos da pátria e os anseios dos seus maiores. Estão-se nas tintas e têm boas razões para isso.

Neste contexto, temer a Ibéria, a União comunitária, o governo mundial judaico-maçónico-trilateralista ou outra bugiganga qualquer é um exercício de pura irrelevância intelectual.
Um destes dias, nem a língua que Pessoa achava ser o único elo identitário nos escapa. E ouviremos um Filipe qualquer dizer em castelhano cerrado, a propósito de alguma reclamação nacional lusitana, o mesmo que o seu antepassado proclamou em 1580: «Não é meu? Mas como, se o herdei, conquistei e paguei?».

quarta-feira, janeiro 28, 2004

CELESTE CARDINA

Segundo julgo ter percebido, as explicações da Senhora Ministra da Justiça sobre a retenção das contribuições à Segurança Social de trabalhadores do seu ministério, terão sido prestadas logo a seguir ao almoço.
Só mesmo esse facto poderá explicar o teor das mesmas.
APENAS MAIS UM

O episódio das contribuições para a Segurança Social retidas a 580 trabalhadores do Ministério da Justiça é apenas mais um a ilustrar a miserável situação a que chegámos.
Efectivamente, ninguém no seu normal estado de lucidez - nem mesmo o Dr. Louçã - suspeitará que a medida tenha sido uma "criminosa manobra de exploração capitalista" promovida pela Dra. Cardona, ou um atropelo intencional aos direitos dos trabalhadores vindo do vil patronato.
A razão é bem menos prosaica e está aos olhos de qualquer observador por desatento que seja: não há dinheiro! A Dra. Celeste e a Dra. Manuela - duas esmeradíssimas donas da nossa casa portuguesa - não se entenderam, porque não há cabedais!
Em normais condições de mercado, não estivesse Portugal na União Europeia, já o Estado teria declarado falência, ou bancarrota, como usava dizer-se nos saudosos tempos da República do Sr. Afonso Costa. O país está tecnicamente falido, isto é, tem mais despesa do que receita, e os capitais próprios não suportam o peso do passivo real, socorrendo-se a máquina estatal a todo o tipo de truques - fiscais e orçamentais, entre outros - para prolongar a sua lenta agonia. Isto reflecte-se, e esta é a dimensão negativa de tudo isto, sobre o contribuinte, esmagado por impostos brutais, aos quais não pode na maior parte dos casos fugir, que servem literalmente para tapar os buracos da deficiente gestão estatal. Não fora isso, e o Estado português falir ou deixar de falir era-nos absolutamente irrelevante.

Seguindo os trâmites habituais, deverá agora a Segurança Social executar a dívida, penhorando e levando a hasta pública edifícios do Ministério em causa, onde, por hipótese, funcionem alguns dos tribunais portugueses. Seria, talvez, uma contribuição sensata para a tão propalada reforma da justiça.

segunda-feira, janeiro 26, 2004

PRESIDENTES

Parabéns ao Gabriel, pela magnífica lição de História na posta com o título em epígrafe no seu Cidadão Livre.
IBÉRIA II

«Estes medos de anexação são absurdos, porque a dura realidade é que a Espanha não nos quer anexar. Era o que faltava! Espanha está muito bem assim, porque pode explorar o mercado português - e explorá-lo-á cada vez mais - no que tem de vantajoso para ela, sem nenhuma responsabilidade pela sociedade portuguesa. Porque desejaria mudar este estado de coisas? É muito diferente da Catalunha e do País Basco, porque são regiões ricas e os impostos que lá se colhem beneficiam o resto do país. A unidade espanhola faz sentido para os castelhanos e para as regiões mais pobres de Espanha, mas mesmo para esses não faz sentido ter qualquer espécie de influência política em Portugal. Para quê? A única coisa que poderia suceder se fossemos anexados por Espanha - o que se calhar não era má ideia - é que talvez viéssemos a beneficiar dos impostos espanhóis!»

Vasco Pulido Valente, Notícias Magazine, 25 de Janeiro de 2004

domingo, janeiro 25, 2004

MONTEIRO - EPÍLOGO

No encerramento da reunião do PND em Fátima, o Dr. Manuel Monteiro justificou assim a sua preferência pelo candidato Cavaco Silva a Belém: «é alguém que tem condições para pôr em prática o sistema de governo em que acredito». O sistema presidencialista, portanto.
Em linhas breves, o que o Dr. Monteiro propõe ao país é um golpe de Estado constitucional: eleito para Belém num regime constitucional semipresidencialista, com forte predomínio do executivo, Cavaco promoveria a partir desse lugar a transformação do sistema para o modelo presidencial, onde o chefe do executivo é, como todos sabemos, o presidente, neste caso, o próprio Cavaco.
Uma opinião destas, inadmissível num aluno de primeiro ano de qualquer curso de Direito, é incompreensível num partido onde pululam tantos juristas e constitucionalistas, alguns deles de inequívoco mérito. Será que não haverá por lá ninguém, que explique ao líder que uma revisão da Constituição não se faz no Palácio de Belém?

sábado, janeiro 24, 2004

MONTEIRO IV

«Nunca escondi que gostaria de ver Pinto Balsemão na Presidência da República, afirmou Manuel Monteiro na entrevista ao «Expresso», embora não fundamente as razões da sua preferência. «Como sei que Balsemão não perspectiva ser candidato, o meu candidato é Cavaco Silva», concluí, num belo exercício de escolha política por exclusão de partes.
Será que o dono do «Expresso» e da SIC «tem condições políticas para levar por diante os objectivos fundamentais da Presidência»? As mesmas de que Santana não dispõe e de que Cavaco só disporá em segunda linha? Quem sabe? Talvez Monteiro nos faça o supremo favor, num dos seus tempos de antena naquela estação televisiva, de explicar tudo direitinho.
MONTEIRO III

Num admirável exercício de quixotismo político que há muitos anos venho admirando, o meu amigo CAA, no seu excelente Mata-Mouros, diz que está em condições de anunciar que o líder do partido da andorinha dará o seu «apoio pessoal» à candidatura presidencial de Cavaco Silva. E acrescenta que «este apoio político expresso é de índole pessoal e, para já, não envolve o PND».
Ora, esta duplicidade de líder e cidadão, a fazer lembrar os tempos em que o General Eanes, ainda presidente, reivindicava a liberdade de intervenção cívica e partidária, desfaz-se por inteiro com a leitura das declarações de Monteiro ao «Expresso» de hoje: «Se Cavaco Silva avançar, dar-lhe-ei o meu voto e o meu apoio. (...) Nessas circunstâncias (a candidatura de Santana Lopes), o PND não deve hesitar na apresentação de um candidato alternativo».
Ou seja: nessas e só nessas circunstâncias (a candidatura de Santana) deverá o PND apresentar um candidato. Se for Cavaco a hipótese nem se põe ou, pelo menos, Monteiro não a pôs. Está tudo dito.
MONTEIRO II

O «EXPRESSO» de hoje, jornal que sempre estimou o líder do partido da andorinha, publica uma extensa entrevista com Manuel Monteiro, francamente com um nível bem acima das suas mais recentes intervenções.
Do longo texto, há que realçar que Monteiro não dará o seu apoio a Santana Lopes numa eventual candidatura a Belém. Porquê? Responde MM: «porque não tem condições para levar por diante os objectivos fundamentais da Presidência».
Eu leria, antes, o seguinte: «porque, se o Lopes ganhar, reforça-se o eixo Lopes-Portas, o que não me interessa nada». Em suma, Portas escondido, com o rabo de Santana de fora.
MONTEIRO I

Confessou à LUSA o líder do partido da andorinha, num momento de rara intimidade: «Nunca na minha vida fiz uma greve ou (...) dei uma falta injustificada, mas confesso que se há pessoa a quem apetecia fazer greve era a mim.
Subentende-se, no vigor translúcido da prosa, que Manuel Monteiro gostaria de fazer greve a si próprio, a si mesmo, à sua identidade, à sua pessoa, portanto. Patrão de si mesmo, soberano da sua vontade, imperador do seu desígnio, Monteiro às vezes não se suporta, manifestação de humildade que é, de resto, característica dos homens de grande dimensão. Compreendemo-lo perfeitamente.
IBÉRIA

José Manuel de Mello, velho capitão da indústria portuguesa, propõe aquilo que é óbvio: a divisão de Portugal em três ou quatro regiões com autonomia política e administrativa, numa inserção de interesses comuns com a Espanha, à qual ele chama «Ibéria». Lembra, ainda, que a Cavaco Silva e ao processo de privatizações que conduziu, se deve o estado em que o país se encontra, dado ter destruído ou não ter deixado recomporem-se, os grandes grupos empresariais portugueses.
FALÊNCIAS

O Estado português deve mais de 120 milhões de euros às empresas do têxtil e calçado, em reembolsos de IVA relativos ao ano passado.
Para além da deslealdade que caracteriza este procedimento (veja-se o que sucede a uma empresa que não pague prontamente os seus impostos), este é uma das razões que leva às falências em catadupa dos últimos anos, sendo precisamente os sectores do calçado e do têxtil os mais sacrificados.
Por isto nos incomoda ouvir o ministro Bagão Félix e o presidente da CIP dizerem levianamente que a maior parte das falências são de empresas de «vão de escada», sem condições, tratando-se assim de um normal ajustamento do mercado. Vê-se.

sexta-feira, janeiro 23, 2004

MEU CARO IRREFLEXÕES,



O facto de não termos boas recordações da "gerência" do Eng. Guterres não faz de nós adeptos fervorosos da governação do Dr. Barroso.
O saudoso Engenheiro, quando alguém lhe colocava um problema ou um sarilho para resolver, sorria tranquilamente, passava a mão pela melena e atirava-a para trás, gesto simbólico com o qual enfrentava qualquer crise. Era a «técnica da melena». O Dr. Barroso, em idênticas circunstâncias, coloca um ar grave, de verdadeiro homem de Estado, proclama o seu amor à pátria, invoca as dificuldades em que o deixaram e aplica-nos mais um imposto ou uma taxa. É a «técnica do rigor».
Se quer a minha opinião, entre um e outro que venha o diabo e escolha.

quinta-feira, janeiro 22, 2004

FOGE P' RÁ TOCA...



...QUE O HOMEM ENDOIDOU:

«O Presidente da República, Jorge Sampaio, fez quinta- feira um balanço positivo de uma deslocação de três dias ao distrito de Aveiro e disse que a visita lhe permitiu confirmar as vantagens competitivas de Portugal.
No final de uma "peregrinação de optimismo" pelas empresas de sucesso da região, que teve de encurtar por ter ficado quase sem voz, Jorge Sampaio manifestou-se satisfeito com a deslocação.
O Presidente da República referiu-se à postura "trágica" a que os portugueses se habituaram e afirmou que é preciso um estrangeiro dizer-lhes que são bons para se convencerem disso.»

Lusa/Fim
VOLTA TONINHO



Submerso no meu doutoramento e completamente alheio ao "país real", meto, volta e meia, o "focinho" fora da toca para ver o que por cá se vai passando.
Ontem, numa dessas raras ocasiões, pareceu-me que o começo do ano não está a ser muito favorável ao governo: violentos aumentos dos preços regulados pelo Estado, inflação a níveis preocupantes, salários reais muito aquém da média comunitária, gestores públicos com ordenados "galáticos" e um discurso delirante do primeiro-ministro que passou do mais negro pessimismo a um optimismo "recuperacionista" completamente irreal e visionário. Quase biblíco. Para quem acha que a economia funciona por estímulos do poder político, a coisa está bem. Para quem pensa que ela depende da oferta e da procura, a coisa está mal. No «Forum TSF» a tónica geral era de louvaminhar o defunto António Guterres (recordem-se daquela novela do Lovecraft, Os Mortos Podem Voltar) e vilipendiar o Dr. Barroso.
Fiquei com a sensação de que nos habilitamos, mais cedo do que seria de prever, a ver em Belém o famoso "picareta falante» e o Dr. Rodrigues em S. Bento, com uma oposição em que o PP terá um protagonismo reforçado (o Dr. Portas nem parece que pertence ao governo actual, tão pouco se faz ver ouvir) e um PSD, de novo, atarantado e em fim de ciclo de poder. Tudo isto sob o mais alto patrocínio de S. Exia. o Jorge.
Neste cenário apocalíptico, provocado talvez por alucinações académicas, o melhor é regressar a toca. Até qualquer dia!

segunda-feira, janeiro 19, 2004

NOVOS LINKS

Ad-Libitum, Don Vivo e Lamechas. Só os conheci recentemente. Bem-vindos.

sábado, janeiro 17, 2004

ABORTO

Eu tinha a intenção de não voltar a escrever sobre o aborto, acerca do qual já me pronunciei em "posta" anterior.
Trata-se de um tema desagradável, perante o qual não é fácil a um liberal tomar uma posição de fundo devidamente fundamentada. Por um lado, há quem entenda, como Rothbard, que a questão deve ser colocada em sede de direitos de propriedade, nomeadamente na propriedade ao corpo das mulheres: enquanto não se der o nascimento, o feto utiliza um corpo sobre o qual não tem direitos, sendo que a proprietária poderá interromper, a todo o tempo, o processo de concepção. Já aqui referi que esta tese me parece absurda e pouco ou nada liberal. Se aceitarmos que não existe vida por geração espontânea, ela não surge obviamente no momento do nascimento, mas no segundo imediatamente coincidente com a fecundação. Por isso, o que está também em causa é a protecção do direito à propriedade do corpo, por parte de quem – o nascituro – não tem ainda capacidade de exercício desse direito. São dois corpos que, momentaneamente, se encontram umbilicalmente ligados, sendo certo que um liberal só poderá conceber a condenação voluntária de um deles se a subsistência da vida do outro estiver posta em causa. Trata-se, neste caso, de uma colisão de iguais direitos de propriedade, sendo-me difícil dizer por qual deles se deve optar. Concedo, porém, que se dê prevalência à vida da mãe. Já a legalização da prática do aborto me parece indefensável, porquanto se está a reconhecer o direito a negar uma vida que já existe e a propriedade a um corpo que está formado. O que não quer dizer que o Estado deva proibir, exceptuando nos hospitais e casas de saúde que lhe pertençam se assim o entender, uma prática que é repetida, frequente e exercida em locais “clandestinos”, mas que todos bem conhecem.

Mas, uma “posta” do Doutor Vital Moreira no seu blogue Causa Nossa, provocou-me uma reacção básica e epidérmica, daquelas que se têm aos vinte anos. Não foi tanto o teor do artigo, que na generalidade não me parece oponível, mas a forma como o iniciou: “Definitivamente a Direita não consegue lidar com a questão penal do aborto…”. “Definitivamente a Direita…”, “a Direita não consegue…”, “a Direita e a questão penal do aborto”, começaram-me a soar na cabeça e irritaram-me profundamente: o Doutor Vital Moreira, homem de reconhecido talento, não consegue ultrapassar a dicotomia esquerda-direita, onde continua a inserir os seus arquétipos e a catalogar o mundo. Não digo que a distinção não permaneça útil, sobretudo para gincanas politiqueiras e partidárias. Mas colocar a questão do aborto nesse maniqueísmo, parece-me ainda mais grave do que tudo o mais que se possa afirmar. Poderá o Doutor Vital dizer que «os partidos de direita não sabem lidar com a questão penal do aborto». Mas nada mais para além disso.
Eu, que não sendo de direita não me considero seguramente de esquerda, não sei exactamente como lidar com a questão do aborto, embora não me restem dúvidas como o Estado deverá tratar do assunto: não tratando; não legislando. Isto é: como o direito à vida do feto não é defensável depois de um aborto consumado, a lei penal já não chega a tempo de evitar coisa alguma, nem há lugar a reparação possível. Quanto ao castigo a infligir a quem aborta, se essa é a preocupação do legislador, que ninguém duvide que o acto é, por si só, castigo suficiente para quem o pratica. Deve mesmo ser até a única pena perpétua que se aplica em Portugal.

O que não é efectivamente admissível é continuarmos a assistir a esta «jurisprudência casuística», em que se julgam meia dúzia de mulheres, médicos e parteiras, por actos praticados aos milhares, em locais por todos conhecidos, com publicidade divulgada em jornais que ninguém incomoda. Ou ter conhecimento que se fazem actualmente em Portugal, escutas telefónicas para recolher prova nesta matéria, como ocorreu no caso de Aveiro. Ou sermos continuadamente incomodados com a algazarra histérica de algumas meninas tontas, a exibirem ventres mal feitos, com pinturas rupestres a proclamarem a soberania uterina. Chega!

P.S.: Vital Moreira invocava como ponto de partida da sua “posta” um artigo publicado hoje no Expresso de João Pereira Coutinho. O texto não é, efectivamente, escorreito: «É possível estabelecer uma linha legal sobre aquilo que uma sociedade civilizada considera como moralmente aceitável. E é possível, perante casos concretos, exibir uma sensibilidade sobre a matéria que não passa por uma condenação em tribunal», escreve Pereira Coutinho. Ficaria assim entregue à «sensibilidade pessoal» dos senhores juízes, procuradores e agentes policiais o tratamento de «casos concretos», sobre os quais o legislador emitiria censura moral. Que belo Estado de Direito!

sexta-feira, janeiro 16, 2004

AGRADECIMENTOS

Ao Rui, do nosso Adufe, pelas palavras que escreveu sobre nossa "posta federalista".

quinta-feira, janeiro 15, 2004

The Bull and the Bear
Acrescentado aos links.
SEXO FORÇADO LATO SENSU



Uma sexóloga (especialista em sociologia sexual) portuguesa anunciou hoje que pelo menos 26,9% das jovens estudantes universitárias portuguesas tinham já tido «sexo forçado», sob «variadas formas».
Portugal consagra-se, assim, numa excelente posição no ranking mundial dos violadores formalistas lato sensu. Seja lá o que isso for.

quarta-feira, janeiro 14, 2004

HERÓIS DO MAR, NOBRE POVO, NAÇÃO VALENTE



Eu não sei o que uma Nação possa ser.
Desconheço e ignoro o que possa existir de tão transcendente que una centenas, milhares ou milhões de indivíduos em torno de ideias, sentimentos, heranças comuns. Como também não vi, até hoje, nenhuma definição sociológica que me satisfaça sobre esse ou outro tema qualquer.
Mas, em verdade vos digo, que nutro enormes desconfianças sobre a Sociologia. Parece-me uma charlatanice oitocentista, que roça o transcendentalismo e à qual só se chega ou alcança por ascese positivista. As categorias sociológicas nunca me entusiasmaram, pela simplificação que comportam.

Por isso não sei o que uma Nação possa ser.
Não conheço, sob minha palavra de honra, o que une os bascos, os catalães, os lapões, os portugueses, ou os chineses. Julgo até que no caso destes últimos, exceptuando serem todos amarelos e terem os olhos em bico, parecendo muito iguais, são entre si bastante diferentes. Enfim, também não é nada connosco. Eles lá se saberão distinguir.

Mas sei, na minha proverbial ignorância, que o conceito de Nação esteve no advento do Estado absolutista. Que em sua homenagem, os princípes governaram esclarecida e absolutamente. Como sei que à Nação se devem alguns totalitarismos que a pretendiam representar e defender: Mussolini, a Nação Romana, Hitler, a Nação (e a raça) Ariana, Estaline, a Nação Proletária. Alguém, penso que Napoleão, terá dito que «O Estado é a Nação em armas». José António falava à Nação. Salazar era nacionalista. Franco também. De Gaulle babava-se de gozo a falar, com aquela soberana majestade que a Inglaterra lhe deu, à Nação Francesa. Como nacionalistas são, ou foram, todos os bonzos da América do Sul, hibrídos produtos do salero andaluz com o sangue indígena, monos da Rua dos Fanqueiros vestidos de marechais e generais, que aterrorizaram e dizimaram populações inteiras.

Eu conheço-me a mim. Mal, é certo. Identifico o meu cão (cães, mais concisamente). Reconheço a minha família (a muito próxima...) e alguns amigos que recebo no alpendre da minha casa. A partir daí, das fronteiras nacionais e patrióticas do meu território, é-me difícil identificar e explicar os outros. Dividí-los, classificá-los, determinar-lhes identidades. Devo ser, sou seguramente, um tipo esquisito e pouco sociável. Não sou nacionalista, portanto.

Pessoa dizia que a sua Pátria era a língua. Talvez. Mesmo assim, quando oiço falar açoreano ou mirandês, tenho algumas dúvidas. Já tentei imitá-los e, até hoje, não consegui.

Por tudo isto, me parece indesejável defender «modelos» (a expressão é atroz, embora sociológica) de organização política a partir de classificações indeterminadas. Não julgo que levem à felicidade dos «povos» (outra), nem, e isto já diz-me mais respeito, dos indivíduos. Como me parecem insuportáveis voluntarismos políticos que queiram impor modelos, sejam quais forem, às pessoas. Julgo, porém, que a realidade vai cuidar de tratar de tudo isso. Já está, penso mesmo, a fazê-lo. A minha intuição diz-me que o tempo que aí vem consagrará verdadeiramente a soberania individual. Parem alguns minutos e fixem os monitores dos vossos computadores. Pensem nisso.
CABALA ANGOLANA



Com justa indignação, o governo angolano reagiu à calunia proferida pela «Human Rights Watch», segundo a qual se desconhece o destino de mais de 3,1 mil milhões de euros, das contas do Estado relativas aos anos de 1997 a 2002. Trata-se, segundo uma nota oficial, de uma campanha contra Angola, logo na altura em que o governo procede à pacificação nacional e à democratização.
Compreende-se a revolta e a indignação pela injustiça cometida: como não se sabe do destino da massa, se ela esteve sempre nas contas do camarada «Zédú», um dos dez mais ricos do mundo, graças à sua audácia empresarial e inteligência criativa? Maior transparência contabilistíca é quase impossível.
AGRADECIMENTOS

Ao Luis e ao Gabriel, do Mata-Mouros e do Cidadão Livre, pelos elogios feitos à nossa "posta" sobre o Federalismo.

terça-feira, janeiro 13, 2004

FEDERALISMO, LIBERALISMO E A UNIÃO EUROPEIA



I. Numa sociedade, como aquela em que vivemos, em que não ficou ainda demonstrada a imprescindibilidade do Estado ou, pelo menos, de uma organização política formal da comunidade, a liberdade individual - valor primeiro para o liberalismo - será tanto mais preservada quanto mais compartimentados estiverem os poderes de soberania.
É a antiga concepção da separação de poderes, mas não só. Ou melhor, não apenas. Isto porque, se nos quedarmos por uma separação meramente horizontal, limitamo-nos a uma repartição de funções entre os diversos órgão do Estado que, podendo exercer contrapesos entre si, obedecem sempre a uma lógica própria, que se preserva na burocracia e que pouco ou nada tem que ver com a salvaguarda dos direitos e garantias individuais.
Por isso se entende que a melhor maneira de dividir a soberania estadual é através de processos de natureza vertical, começando de baixo para cima, isto é, do indivíduo - que deve ser fonte e sujeito de direitos de soberania - até aos órgãos centrais do Estado.
É de permeio que se encontra a lógica do federalismo. Ela representa a criação de patamares diversos de poder, em relação simultânea de autonomia e dependência de uns para com os outros. O princípio estruturante fundamental será o da subsidariedade, segundo o qual o poder hierarquicamente superior só deve intervir se o imediatamente inferior não tiver capacidade - lógica, política e constitucional - para o fazer. Por isso se encontra na orgânica dos Estados federais - EUA e RFA, só para citar os mais representativos, órgãos de governo sobrepostos, com poderes soberanos em correlação, ordenados pelas respectivas constituições estaduais e federal. Isto permite um exercício do poder mais próximo dos cidadãos, que eles controlam mais convenientemente e no qual têm mais hipóteses de colaborar. As competências dos Estados federados são vastíssimas - desde a educação à justiça -, sendo que o cidadão não tem de remeter-se aos poderes burocratizados das capitais estaduais e dos governos centrais, para resolver os assuntos que o relacionam com o Estado. Isto não tem, ao invés do que se depreende do que escreveu CN da Causa Liberal, qualquer aproximação a conceitos de «eleições gerais multinacionais», ou a ideias mundialistas, vagamente inspiradas pelo "pacifismo" soviético dos anos setenta e na doutrina "conspiracionista" do governo mundial.

II. Estes equívocos resultam, muitas vezes, do processo comunitário de integração, iniciado em 1952 e 1957, com os Tratados de Paris e de Roma, nos quais se instituiram, respectivamente, a CECA e a CEE e a CEEA. Também aqui, o federalismo não foi a pedra de toque, apesar de, ao tempo, muito se ter falado no assunto e ser essa inequivocamente a meta pretendida.
Só que, inteligentemente, o verdadeiro inspirador do processo comunitário, Jean Monnet (uma personagem impressionante, por vezes pouco conhecido e confundido com um qualquer cinzento burocrata, mas que foi verdadeiramente um aventureiro imbuído do melhor espírito liberal e de "empresa"), percebendo e antevendo as resistências dos Estados a um processo de federalização imediata - note-se: dos governos dos Estados, zelosos dos seus poderes de soberania, muito menos que das suas populações - enveredou pela técnica de integração funcionalista, que propõe o gradualismo processual, através da soberania exercida em comum sobre áreas delimitadas de actividade. Nomeadamente, na administração comum de recursos utilizados nas máquinas de guerra estaduais - o carvão, o aço e a energia atómica -, e na liberdade de comércio entre os povos da Comunidade.
Isto gerou um ambiente de progresso e de paz que a Europa Ocidental jámais conhecera, reforçando os direitos individuais de forma impressionante. Os nossos filhos, por exemplo, já não saberão o que foram as fronteiras continentais. Mas nós lembramo-nos bem delas e das prepotências que os Estados, em nome dos valores da pátria e da nação, exerciam sobre todos nós. Desde logo, na aplicação de direitos aduaneiros sobre simples bens de consumo.
Sem dúvida que este processo não está isento de falhas e de equívocos, prova clara de que tem obedecido a uma lógica liberal de desenvolvimento, de aposta na criação de uma ordem comunitária espontânea e natural, e não tanto num dirigismo construtivista. Sem dúvida que, de tempos a tempos, os ímpetos construtivistas vêm ao de cima. A verdade, porém, é que são rechaçados, por não corresponderem verdadeiramente a ordem espontânea que se está a gerar. Nesse aspecto, a intergovernamentalização com vista à comunitarização de políticas sociais, é um erro. Não tem, até aqui, sido bem sucedidas. Felizmente.
Como também é antipática a burocracia de Bruxelas, ainda que em muito menor número do que as burocracias nacionais. Ou a questão da legitimidade democrática do poder constituinte das comunidades e, desde Maastricht, da União. Mas, pergunta-se: será que existe verdadeiramente fundamento democrático nas constituições dos Estados actuais? Não terão elas sido resultado de acordos entre a classe política, legitimados pelo pueril exercício formal do voto?
Não se sabe, por conseguinte, no que irá resultar da União Europeia. Felizmente, isso quer dizer que não entra aqui uma lógica historicista, nem construtivista. Ainda que, repito, sobretudo quando os governos dos Estados-membros são maioritariamente socialistas, tenham surgido essas tendências. Mas as conquistas de bem-estar, industrialização, desenvolvimento, livre-concorrência, protecção jurisdicional dos direitos individuais, são inegáveis. E, garantidamente, já não poderíamos viver sem elas. Pelo menos, tão bem como vivemos agora.
Tudo isto não é, por enquanto, federalismo. Nem será federalismo a construção de um directório em Bruxelas dos representantes dos Estados, com poderes reforçados e centrais, se alguma vez vier a suceder. Isso seria, de facto, a construção de um super-Estado central e não um Estado federal, Comparar-se-ia à repetição da «Santa Aliança» e do «Concerto Europeu de Viena» de 1815. Estou, aí, em pleno acordo com CN: era só o que mais nos faltava.

segunda-feira, janeiro 12, 2004

«A HISTÓRIA DA LIBERDADE»



"O federalismo tem sido a mais eficaz e a mais adequada forma de controle à qual a democracia pode ser submetida. (...) O sistema federal limita e restringe o poder soberano porque o divide e concede ao governo apenas certos direitos definidos. É o único modo de moderar não só a maioria, como também o poder de todo o povo, ao mesmo tempo que proporciona bases mais sólidas para uma segunda câmara, que tem sido considerada essencial para a garantia da liberdade em todas as autênticas democracias".

Lord Acton


SECÇÃO «FUNIL E CORNETA» APRESENTA:


Otto Bismarck, o Federalista



Sr. Adolfo, precursor do Mercado Comum Europeu



Prof. Doutor José Estaline, titular da Cátedra Vladimir
Lénine de Federalismo Soviético



James Madison, teorizador do centralismo democrático

domingo, janeiro 11, 2004

IN MEMORIAN: DENIS DE ROUGEMONT (1906-1985)



«O federalista não pode, portanto, adoptar para a crença na soberania nacional absoluta senão uma atitude de cepticismo integral, temperada por uma preocupação de clínico: o partidário do Estado-Nação, de facto, não é apenas um homem sem razão ou que persiste, maldosamente, no seu erro. É antes um homem que sofre de um temor mórbido de perder um poder mágico que não existe
EFEMÉRIDES: A JANEIRINHA



Aproveitando a presença no Porto, em pleno mês de Janeiro, do Primeiro-Ministro Durão Barroso, que preside ao governo que mais pesadamente aumentou a carga fiscal em Portugal desde o 25 de Abril, tem cabimento recordar um outro episódio, ocorrido também nessa cidade, em Lisboa e em Braga, em Janeiro de 1868, que ficou para a História com o nome da Janeirinha.
Era ministro da Fazenda o todo poderoso Fontes Pereira de Melo (na gravura à esquerda), que assinara um decreto que regulamentava o imposto de consumo (sisa). Os comerciantes e burgueses protestaram contra a política fiscal do governo, tendo sido no Porto, onde chegou a haver tiroteio, que os acontecimentos se decidiram: o governo, presidido por Joaquim António de Aguiar, caiu, levando consigo o ministro da Fazenda.

É pena que os liberais portugueses, tão activos na blogosfera, não se lembrem e não aproveitem estas efemérides, tão poucas, em que a população portuguesa se insurgiu contra os desmandos fiscais dos nossos governos, para honrar o passado e, quem sabe, antever o futuro.
UMA AGENDA PREENCHIDA (DESCUBRA AS DIFERENÇAS)


Candidato ao Parlamento Europeu, 2004.



Candidato à Presidência da Câmara de Mondim de Basto, 2004



Primeiro candidato da ND pelo círculo de Lisboa às legislativas, 2005



Candidato da «Direita Unida» às presidenciais, 2006


sábado, janeiro 10, 2004

QUE PENA!



Apesar de ter sido garantido,em manchete de primeira página, pelo prestigiado jornal «Expresso», jornal de referência que só publica notícias devidamente confirmadas, o ilustre Advogado José Maria Martins não assegurará a defesa de Saddam.
Tudo não terá passado de uma graçola de alguns colegas lisboetas e das suas secretárias, e não de um convite do Presidente da Liga Árabe, como o jornal terá noticiado.
Apesar do desfecho desta história não ser bem o esperado, todos estão de parabéns: os advogados brincalhões, que nos divertiram como já não há memória desde a célebre jantarada dos «árabes» no Tavares; o Expresso, que assim demonstra o rigor com que investiga e confirma o que publica; o Bibi, que agora terá o ilustre causídico a tempo inteiro na sua defesa; e, por fim (os últimos são sempre os primeiros), o fantástico José Maria Martins que, cumprindo as suas ambições de criança, passará finalmente à História. Embora não propriamente como advogado.
CHARLES VAN ZELLER DARWIN



Perante o negro panorama com que as empresas portuguesas se confrontaram em 2003, e que, segundo a Coface Mope, uma empresa francesa que avaliou a situação, registou mais de 2900 encerramentos e falências, o Presidente da CIP, Francisco Van Zeller, proclamou alto o seu darwinismo social afirmando à TSF que: «Se houver um certo 'darwinismo' a sobrevivência é dos mais aptos, dos melhores, aqueles que pagam melhor, aqueles que investem mais, os mais competitivos. (...) Porque se as que morrem são as que pagam mal, que fogem aos impostos (...) então até é bom que elas saiam» .
Esta perspectiva símiesca da economia nacional, não leva certamente em conta o proverbial atraso português, nomeadamente em infra-estruturas (que nos nos países civilizados são pagas pelo dinheiro dos impostos dos contribuintes), ou a excessiva carga fiscal que se abate sobre os cidadãos e as empresas, ou a burocracia asfixiante do Estado, ou a administração pública portuguesa que consome parte substancial do orçamento para prestar serviços de péssima qualidade, ou a legislação laboral socialista que temos há quarenta anos, etc. Para Van Zeller, patrão dos patrões, o que faz falta aos pobres empresários portugueses é lerem «A Origem das Espécies».
Não se poderá pedir ao Dr. Carvalho da Silva que se candidate à sucessão do ilustre darwinista?
«THE TOURTURE NEVER STOPS»



José Lamego deu hoje início às actividades do seu nóvel grupo de influência designado «Clube do Chiado», com uma conferência, no Grémio Literário, na qual participam, entre outros, Giuliano Amato e António Vitorino. O clube reune personalidades de esquerda, onde se destacam Carlos Gaspar, Severiano Teixeira, José Amaral, Maria Carrilho, Luís Campos e Cunha e Rui Vieira Nery, quase todos ligados ao PS.
Trata-se do mesmo Lamego que, nesta semana, em pleno dia de reunião da Comissão Política do PS, reuniu perto de 60 «amigos» num jantar onde pontificavam Jorge Coelho, António José Seguro, João Soares, Alberto Costa, Miguel Coelho e Jamila Madeira. A coincidência das duas reuniões não passa disso mesmo, até porque, sabendo-se das boas relações que Lamego mantém com a actual Direcção do PS, Jorge Coelho prontificou-se a esclarecer à entrada do repasto que «ser-se amigo de alguém não quer dizer que se seja inimigo de outro». Estas declarações, um bocadinho ao arrepio dos velhos brocardos populares «diz-me com quem andas...» e «amigo de meu amigo...», «ha-dem» certamente tranquilizar a liderança do partido.
Nesta semana soube-se também que Manuel Maria Carrilho está disponível para avançar para a Câmara de Lisboa. Para uma candidatura, entenda-se, e não para qualquer putch autárquico, porque ele, como já teve oportunidade de frisar o Dr. António Preto, é um candidato estimável e pacífico, que até agrada ao PSD.
Por fim, parece também assente que o Dr. António Costa e a Dra. Ana Gomes se preparam para abalar para Bruxelas, em exercício de um legítimo e merecido direito ao repouso.

Perante tudo isto, o melhor que Ferro Rodrigues conseguiu dizer foi que estava muito satisfeito com a disponibilidade de Carrilho, porque assim não se repetirá o que se passou em 1989, quando o PS não tinha candidatos a Lisboa e o secretário-geral, ao tempo Sampaio, lá teve de fazer o frete. Do qual, diga-se em abono da verdade, se viu livre à primeira oportunidade.

Alguém se lembra, por aí, daquela música do Zappa, cujo título era «the tourture never stops»?

sexta-feira, janeiro 09, 2004

MAIS UMA TAXA



Desta vez, para custear o serviço audio-visual do governo. No valor mensal de €1,60, facturado na conta de luz da EDP. Seja ou não utilizador desses serviços, seja cego e surdo, tenha ou não televisor e rádio, a taxa é obrigatória. Mais: qualquer cidadão pagará tantas taxas quantas as casas abastecidas pela EDP tiver. Por último: o governo prepara-se para aplicar esta taxa às empresas. Sendo, por definição, as taxas o pagamento de um serviço prestado pelo seu utilizador, não é difícil imaginar as empresas a beneficiarem dos belos programas da RTP e da Antena 1.
É mais um caso chocante de dupla, tripla, quádrupla trbibutação, imposto por um governo que jurara baixar os impostos.
Os eleitores terão de dar nas urnas a conveniente resposta a este governo socialista.
A CORAGEM DOS MEDIA

Os jornais informam-nos, em notícias esconsas de quarto de página, que o Tribunal Constitucional voltou a detectar financiamentos ilegais aos partidos políticos.
Desta vez, relativas ao ano 2001, em que ocorreram eleições autárquicas, o TC detectou nas contas dos três maiores partidos (PSD, PS e CDS) a ausência das receitas e despesas das estruturas locais, algumas delas, como as de Lisboa e Porto, poderosíssimas, apenas tendo sido enviadas as contas das estruturas centrais, e a falta de registos contabilísticos e de suporte documental, bem como o pagamento de quantias ignoradas em numerário não depositado. Conclui o TC que, deste modo, os partidos escondem a maior parte do seu dinheiro ao tribunal.
Esta situação, que em qualquer empresa privada originaria a abertura de inquéritos criminais, com consequências que poderiam levar a penas muito sérias, no universo partidário provoca a aplicação de simples coimas.
Mas, mais do que fuga ao fisco, o que aqui está em causa é saber porque escondem os partidos os seus financiamentos. De onde vêm? E o que é prometido em troca? Se estes movimentos fossem claramente conhecidos, talvez se compreendessem melhor certas facilidades concedidas pelo poder central e autárquico (sobretudo por este último) a algumas empresas e empresários, sobretudo da construção civil
Espanta, também, o relativo mutismo da comunicação social sobre o assunto. E pensar que ainda há pouco tempo, se fez um alarido tremendo por eventuais financiamentos de uma Universidade privada a um partido político. Ninguém quer fazer, agora, primeiras páginas sobre este assunto?

quinta-feira, janeiro 08, 2004

MÁXIMA LIBERDADE, MÁXIMA RESPONSABILIDADE

No meio do desvario em que o processo Casa Pia lançou a classe política, alguém, ontem, na Assembleia da República, sugeriu que "provavelmente, o Parlamento terá que tomar responsabilidade, ou no âmbito constitucional ou no âmbito legislativo, de ponderar os limites de liberdade de comunicação em relação com os processos judiciais".
Esta reacção corporativa da classe política, de introdução de controle censório da comunicação social, da qual apenas parece querer afastar-se o Bloco de Esquerda, não visa proteger os direitos liberdades e garantias dos cidadãos, mas proteger-se a si própria. Se assim não fosse, há muito que esta iniciativa teria tido lugar. Contudo, só o foi agora porque, pela primeira vez na História da IIIª República, a comunicação social, dividida em três ou quatro poderosos grupos, parece ter perdido o pouco que ainda sobrava de respeito pelos políticos.
Porém, numa sociedade democrática e liberal, os termos do problema devem ser colocados de outra forma que não nesta, à qual corresponde, grosso modo, o regresso de limites censórios à liberdade de expressão.
A nosso ver, a comunicação social, como qualquer outra pessoa singular ou colectiva, deverá ter máxima liberdade de expressão. Poderá e deverá, por conseguinte, dizer e escrever o que bem entender sobre seja quem quer que seja. Com uma ressalva: a estrita vinculação ao dever de verdade, cuja violação não poderá encontrar guarida nas «informações das fontes». Tal violação deverá constituir ilícitos criminal e civil gravíssimos, já que, por sua vez, lesam direitos fundamentais dos cidadãos. A tais ilícitos deverão corresponder penas de prisão e pecuniárias pesadíssimas para os seus responsáveis que, na verdade, pelos seus actos podem destruir a reputação e a vida das pessoas que visam. Por último, o enquadramento legal não poderá permitir subterfúgios, e deverá ser suficientemente claro para permitir a um juiz a aplicação devida dessas penas. Nomeadamente, a lei tem de distinguir a responsabilidade da publicação da notícia da responsabilidade da informação. Esta é das fontes utilizadas que poderão manter-se anónimas. A primeira é do jornal e do jornalista que toma a decisão de publicar e é a que efectivamente provoca o dano, devendo ser devidamente penalizada, quando foge à verdade.
A situação actual é insustentável, porque se caracteriza por um princípio de máxima liberdade e mínima responsabilidade: cada um diz e escreve o que lhe apetece, e se um visado, se sentir ofendido e com necessidade de defesa e reparação, não tem mecanismos disponíveis para a salvaguarda dos seus direitos. Se exigir a publicação de um esclarecimento ou de um desmentido com o mesmo destaque da notícia, verá a sua carta ir direitinha para o correio dos leitores. Se processar judicialmente quem o ofendeu, tem uma probabilidade reduzidíssima de obter uma condenação. Em tempo útil, pelo menos, essa probabilidade é igual ou menor que zero.
Em tempos, ouvi dois jornalistas dizerem que, para a classe, os processos judiciais eram medalhas e condecorações. Acobardados como estão os políticos, talvez algum responsável se lembre de propor a condecoração com a «Torre e Espada», no próximo 10 de Junho, de alguns dos nossos «jornalistas de investigação».
CHORAMINGUICES



Lamentável, ontem, a intervenção lacrimejante do Presidente da Assembleia da República, em defesa do seu nome e imagem, utilizadas na capa de uma revista a propósito do processo Casa Pia.
O mesmo se poderá dizer da generalidade dos políticos, muito preocupados e apreensivos com os prejuízos que este caso poderá estar a provocar ao bom nome (?) da classe, ao ponto de aventarem reuniões do Conselho de Estado com ordem de trabalhos dedicada ao assunto.
Sobretudo, quando ao longo dos últimos anos, jornais supostamente de referência – refiro apenas o Independente e o Diário de Notícias, para não ir mais longe – usaram e abusaram da liberdade de imprensa, pondo na lama o nome de centenas de cidadãos. Valeria a pena, já agora, fazer um esforço e investigar quantos desses visados foram, efectivamente, culpados ou responsabilizados por alguma das coisas de que a comunicação social os acusou. Porém, nunca ao longo das últimas décadas, com mais do que pretexto para isso, em situações e com acusações bem mais graves do que as que estão em causa no processo Casa Pia, me lembro de qualquer intervenção moralizadora ou correctiva de um político. Razão: vá-se lá saber porquê, os políticos, na sua generalidade, pelam-se de medo da comunicação social. Por isso, deixaram-na trepar desalmadamente. Estão, agora, a ser devorados pelo mostrengo que, ao longo destes anos, andaram a engordar.

quarta-feira, janeiro 07, 2004

O FIM DE UM SÍMBOLO



A marca BCP - Banco Comercial Português vai desaparecer. As razões prendem-se com a reestruturação interna do grupo e a incorporação das suas quatro marcas (BCP, Atlântico, Sotto Mayor e Império) numa só, que a todas represente sem distinção, redefinindo a imagem e racionalizando recursos.
Não se põe em causa a estratégia seguida, seguramente mais conveniente para os interesses do grupo, embora lamentemos o fim de um símbolo tão importante como foi o BCP.
Na verdade, quando, nos idos de 1986, o banco abriu as suas portas ao público, representou o começo do fim do estatismo e o regresso do espírito de iniciativa privada e de liberalização. Não só na banca, onde foi pioneiro, mas, por extensão, em toda a economia e na vida nacional em geral.
O funcionamento imediato do banco demonstrou, na altura, que o que é privado é melhor, de longe melhor, do que o que pertence ao Estado. Nessa época, toda a banca portuguesa se encontrava nacionalizada. Funcionava mal. Uma ida a um banco para levantar um cheque era, lembro-me bem, um suplí­cio infernal. Horas imensas a espera de ser atendido, pessoal negligente e desagradável. A primeira imagem de marca que o BCP conseguiu imprimir na opinião pública era a de que nos seus balcões não se formavam filas de espera. E era verdade. Como, também, era genuína solidez exibida pelo grupo, patente, de resto, na magnífica concepção estétita das suas graníticas instalações, no rigor e preparação dos seus quadros, no profissionalismo e eficácia do seu atendimento.
Tudo isto, que contrastava com a desorganização e imcompetência da banca nacionalizada, ajudou Portugal a perceber que, ao contrário do que o 25 de Abril lhe impingira, era na iniciativa privada e na liberdade que se podia encontrar o futuro. Nunca no socialismo.
O Banco Comercial Português fez mais pela democracia e pela liberdade de Portugal do que qualquer partido ou político de então.
A marca termina agora. É substituída por uma - Millenniun - que nos parece francamente incaracterística e vulgar. O banco passará a não se distinguir dos seus competidores mais directos, que são a banca institucional - Caixa Geral de Depósitos - e estrangeira. Talvez possa ganhar em rentabilidade e eficiência. Mas perde um estatuto importantíssimo que lhe foi dado pela História, que lhe assegurava um nicho de mercado de prestígio, e que era parte integrante dos seus activos. É pena.
O ORÁCULO DE VÍTOR



O grande Guru do Banco de Portugal, Dr. Vítor Constâncio, acabou de anunciar as sua previsões para 2004.
Consultados os oráculos, lidas as folhas de chá, observadas as estrelas e interpretados os auspícios, o Guru anunciou um aumento dos salários reais em virtude da queda da inflação. Embora não o tendo dito expressamente, mas deixado subentender (quem souber ler, leia), o país, a economia e a vida dos portugueses continuarão a mesma merda (em sentido alquímico, note-se) de sempre.
Pobre João Miranda, que julgava que a economia e a vida das pessoas não podiam ser previstas...

terça-feira, janeiro 06, 2004

Austríaco - Novo link.
MONARQUIA vs. REPÚBLICA



Parece que Sampaio falou mesmo, e ter-se-á queixado da desdita que sobre ele se abateu no âmbito do processo Casa Pia, ao ter visto o seu nome na comunicação social envolvido no assunto.
Apesar de múltiplos desagravos e das manifestações de solidariedade provenientes das mais recônditas paragens - do Procurador Geral, ao Bastonário da Ordem dos Advogados, ao Primeiro-Ministro, até ao revolucionário-institucionalista Francico Louçã -, S. Exia. não conseguiu reter o incómodo da situação e, vai daí, disse-o aos portugueses.
Eu não me lembro de, em muitas outras situações recentes, em que os media promoveram julgamentos sumários e condenações na praça pública de pessoas que não tinham sido sequer julgadas, menos ainda condenadas pelos tribunais, de ver ou ouvir S. Exia. a pronunciar-se. É facto, porém, que desta vez a coisa lhe toca, ele que é o mais alto magistrado da Nação, um símbolo da Pátria, e ainda por cima com infâmias horríveis sobre crimes hediondos.

As reacções, lidas e ouvidas, da população, situam-se em posições maniqueístas, de considerar uma ofensa tocar-se na honorabilidade do Presidente, ou de de ter como um ultraje que o dito tenha utilizado as suas funções e inerentes poderes, para defender a sua honorabilidade pessoal e vida privada. Estamos, no limite, a discutir a própria natureza da chefia do Estado - monárquica ou republicana - vexata quaestio da política portuguesa. Para os monárquicos, sendo o chefe de Estado não mais do que um símbolo, ele deve ser preservado ao máximo («the King can't do no wrong»). Daí a tê-lo como pessoa idónea, impoluta e acima de qualquer suspeita, vai um pequeno passo. Para os republicanos, o chefe de Estado, por o ser, não perde os seus direitos e obrigações civis, pelo que deve respeitar a fronteira entre as funções que exerce e o que à sua vida privada diga respeito. Ainda que, para certos procedimentos possa ter um tratamento especial (como a investigação criminal ser da responsabilidade do STJ, ancestral tradição com origens no privilégio do foro eclesiástico medieval).
O que é facto é que o Dr. Jorge Sampaio se posicionou como um monarca ofendido, ao usar o seu tempo de antena presidencial para se confessar agravado num assunto puramente civil.
De todo em todo, não seria mau que a questão da forma da chefia de Estado português - absurdamente limitada pela Constituição em vigor - fosse objecto de um debate sério e até de um referendo nacional.
SAMPAIO FALOU?



Posso confirmar ter visto ontem, no noticiário das 20.00 h, S. Exia., o Presidente da República Portuguesa, a abrir e fechar a boca à frente de um microfone, com um papel nas mãos e as lentes dos óculos vagamente embaciadas. Não garanto que tenha falado, nem posso reproduzir nada do que eventualmente tenha dito, já que estava com a família (duas ruidosas crianças...) num barulhento restaurante, e o televisor estava sem som. De todo o modo, creio não ter ficado a saber menos do que a generalidade dos meus compatriotas.

segunda-feira, janeiro 05, 2004

A DOIS



Mais uma grande reforma do Governo.
FICAR NA HISTÓRIA


(Filibuster)

José Maria Martins, afamado advogado de Bibi, afirmou estar a ponderar o convite que lhe foi feito para integrar a equipa de defesa de Sadam Hussein porque sempre desejou «ficar na História».
PÃO E CIRCO



Do Jornal de Notícias:

«Fisco tenta cobrar dívidas já saldadas
Contribuintes recebem notificações para pagar montantes já entregues


Os serviços do Ministério das Finanças estão a notificar contribuintes que já pagaram as suas dívidas fiscais para as regularizarem de novo. Ao que o JN apurou, as repartições de Finanças de todo o país estão inundadas com casos de pessoas e empresas que são solicitadas a pagar outra vez as dívidas que entretanto saldaram com o Fisco.
"Tem acontecido muito isso nos últimos tempos", reconheceu, ao JN, Domingues Azevedo, presidente da Câmara dos Técnicos Oficias de Contas. "A questão central é que há uma grande descoordenação na máquina fiscal. As repartições e os serviços centrais não conseguem cruzar as informações em tempo devido".
"O problema é que a ministra das Finanças quer andar mais depressa do que lhe permite o sistema informático que o Fisco tem para cruzar dados e cobrar dívidas", comenta, recordando o que lhe foi dito pelos funcionários da repartição de Finanças onde se dirigiu para resolver o problema do seu cliente: "Disseram-me para não desesperar, porque casos como o do meu cliente tinham lá muitos"...
Domingues Azevedo alerta para o facto de os processos por dívidas ao Fisco poderem ir parar ao Tribunal. "Aos contribuintes, individuais ou empresas, basta-lhes fazer prova de que houve um erro administrativo para lhes ser devolvido, com juros, o dinheiro, caso tenham pago uma segunda vez. O problema é que os tribunais são um mundo de confusões, o que significa que as pessoas podem ter o seu dinheiro de volta muito tempo depois de o terem entregue ao Estado". »


É necessário, porventura, acrescentar alguma coisa? A não ser que não há memória de um Governo que, como este, tenha faltado tão escandalosamente aos seus compromissos eleitorais e que tenha cometido semelhantes abusos e arbitrariedades contra a propriedade privada. Com a notável passividade da população, é certo: o que interessa é o processo Casa Pia e o caso Moderna. Na verdade, se não houver pão, salve-se ao menos o circo.

sábado, janeiro 03, 2004

a) AGRADECIMENTOS E b) ACTUALIZAÇÕES

a) Aos blogues que nos distinguiram nas atribuições de prémios de fim de ano, nomeadamente (esperando não esquecer ninguém): Contra-a-Corrente, Fumaças, Janela Para o Rio, Mata-Mouros e Último Reduto;

b) Acrescentámos o Eclético aos links.

sexta-feira, janeiro 02, 2004

O QUE SE PODE TENTAR PREVER PARA 2004



ECONOMIA – Portugal é, foi e será um pequeno e pobre país que desperdiçou a oportunidade de modernização que a União Europeia lhe concedeu e os fundos poderiam ter concretizado. Qualquer promessa, ou ilusão, de sairmos da crise económica, não passa de propaganda política, condicionada pela agenda eleitoral. Portugal tem um problema de subdesenvolvimento estrutural, que não se explica pelas flutuações cíclicas dos modelos das economias desenvolvidas.

GOVERNO – Primeiros sinais de desgaste poderão ocorrer em função dos resultados das eleições europeias. Se a acção corrosiva da Nova Democracia surtir algum efeito, o PSD passará a olhar para o CDS com outros olhos e os velhos ódios a Portas poderão vir definitivamente ao de cima, condenando a coligação governativa.

OPOSIÇÃO – Condicionada pela evolução do processo Casa Pia e pelo desempenho do Partido Socialista. Não se antevê nada de bom, pelo que da fraqueza da oposição se fará a força de um governo fraco.

PARTIDOS – O PSD e o CDS tentarão manter as suas reservas eleitorais para o que terão necessidade de salvaguardar algumas aparências de desentendimentos programáticos. As eleições europeias poderão ser uma boa oportunidade. Mas, o grande dilema será o de avançar para os actos eleitorais que aí vêm em listas únicas ou separadas. Estas últimas poderão produzir a sensação ao eleitorado de que os dois partidos são, apenas e só, um único, ainda por cima em exercício conjunto de funções governativas. Isto levará à transferência de voto à esquerda (PS e Bloco de Esquerda) e à direita (Nova Democracia).
O PS manter-se-á como está, sem evoluções, ao contrário do que possam pensar alguns analistas. Nem Ferro sai, nem Vitorino entra. Esta Direcção é persistente e está convencida de que o poder lhe irá parar às mãos – com Casa Pia ou sem ela – assim que o eleitorado se canse do governo.
O PCP também não conhecerá qualquer alteração de substância, nomeadamente a substituição do Secretário-Geral, de resto, anunciada no primeiro dia em que tomou posse… Os dirigentes comunistas – ortodoxos e reformadores – sabem bem que a essência da doutrina de Álvaro Cunhal é a de nada mudar para que tudo fique na mesma. E a verdade é que o PCP continua a ser um dos poucos partidos comunistas com influência nacional depois da queda da URSS.
O Bloco de Esquerda continuará a não conseguir traduzir em votos o protagonismo mediático e político dos seus dirigentes, nem consumará o velho sonho de se substituir no espaço do PCP. Pelo menos, enquanto este partido não ceder à tentação das inovações, avançando para um terreno onde claramente os socialistas académicos do Bloco estão bem melhor colocados. Por outro lado, ao eleitorado alentejano e operário, velhas reservas sociológicas do PCP, os floreados discursivos de Louçã impressionam pouco ou nada.
A Nova Democracia terá a sua primeira prova eleitoral, donde sairá temida ou extinta.

JUSTIÇA – Até ao início do julgamento do processo Casa Pia, vai ser marcada por este caso. Quando o julgamento começar a andar em velocidade de cruzeiro, talvez exista ambiente para se pensar na sua reforma profunda.

MORAL – Em crise continuada. Os portugueses perderam há muito o respeito por si próprios, ao deixarem-se alimentar por uma comunicação social rasteira e que fomenta «casos» para os entreter. O povo gosta de circo e os media fornecem-lho. Os portugueses viciaram-se em pequenos e médios escândalos servidos nos noticiários e nos jornais. Vivem e alimentam-se disso. Não pensam em quase mais nada. Enquanto não houver coragem política para introduzir uma legislação severa sobre a comunicação social, o abandalhamento nacional continuará e os portugueses vão cada vez mais gostar menos de si mesmos.

MANUELA FERREIRA LEITE – Vai continuar a ser a Ministra das Finanças que está a fazer tudo ao invés do que foi prometido em eleições. Os impostos aumentarão, por via directa disfarçada (taxas) ou indirecta, e a grande preocupação do seu Ministério permanecerá a de empobrecer os portugueses, cobrando-lhes o dinheiro que não possuem e que a economia nacional não lhes permite ganhar.

FALÊNCIAS, DESEMPREGO E GREVES – Crescerão, sem que o governo promova qualquer reforma estrutural digna desse nome, que poderia a médio prazo inverter a tendência, por receio de perder as eleições cujo ciclo se inicia este ano.

REFORMA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – Hã?...

CONSTITUIÇÃO EUROPEIA – Existente, pelo menos, desde 1992, com regras clarinhas que instituíram um governo soberano da União (contra, obviamente, a soberania dos Estados-membros), servirá de leit-motiv partidário. Quem conhece verdadeiramente um pouco da matéria, sabe que o caminho da união política foi definitivamente encetado com o Acto Único de 1987 e que teve na abolição das fronteiras internas e no euro as suas duas mais importantes marcas. A questão do Ministro dos Negócios Estrangeiros Europeu e, consequentemente, da existência de uma política externa comum, bem como a de uma Constituição formal, são somente a cereja do bolo. O mais importante já foi feito. Há muito.

POLÍTICA INTERNACIONAL – Condicionada pelas eleições americanas, por sua vez, dependentes da evolução do Médio Oriente. Por enquanto, as coisas não parecem estar a correr mal à Administração Republicana. Esperemos que assim continuem.

FUTEBOL – Um país triste, deprimido e sorumbático não ganha coisa nenhuma. Muito menos jogos de futebol. Por conseguinte, não ganharemos o Euro 2004. Os estádios de província entretanto construídos com dinheiros públicos servirão de refugio a toxicodependentes e sem-abrigo. Está feita a boa acção do ano.
E AGORA, ALGO VERDADEIRAMENTE IMPORTANTE

Em 2004, menos oito feriados do que em 2003. Está explicada a razão pela qual sairemos, neste ano, da crise económica.
ESTÁ REPOSTO O EQUILÍBRIO...

...No processo Casa Pia.
Graças a Adelino Granja, ficámos a saber que também no PSD e no CDS, e não apenas no PS, existem pedófilos. Ainda que os nomes não tenham sido claramente enunciados não tardarão vinte e quatro horas para que a comunicação social, prestando mais um elevado serviço à pátria, os descubra e anuncie. A seguir aguarda-se a revelação dos pedófilos dos partidos mais pequenos, a saber, do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista. Da Nova Democracia não, porque, como atempadamente nos avisou, o Dr. Monteiro não deixa que essas coisas, próprias do parque Eduardo VII, por lá apareçam.
Felizmente, também na pedofilia não somos sectários nem descriminatórios. A monólitica insistência em nomes de supostos pedófilos socialistas, começava a deixar-nos inquietos. Está reposta a universalidade da alma lusa.

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